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6. Maçã do Amor e A Primeira Encruzilhada

“Já matei alguns sentimentos,
mas foi em legítima defesa”
(Zack Magiezi)

- Quer maçã? – Pergunta Violeta.
Lena ergue os olhos do celular.
- Não, obrigada.
Violeta sacode os ombros e crava os dentes na maçã vermelha. E mastiga. Ela olha para o outro lado do refeitório. Lena segue o olhar dela.
- É, parece que agora você pode encará-lo. Ele nunca vai ter coragem de olhar pra você de novo.
Lena falava de Fernando, claro. E apesar do tom usualmente azedo e zombeteiro de Lena ser para Violeta a melhor qualidade da amiga, doeu daquela vez.
Talvez ela tivesse se precipitado.
Talvez Fernando fosse apenas um rapaz bonito e tímido que a achava bonita, mas ainda estivesse criando coragem para falar com ela.
Talvez ela tivesse arruinado qualquer chance de conhecer melhor o garoto, e em fim descobrir suas reais intenções.
Violeta balança a cabeça.
- Não é justo, Lena. Por que eu sinto como se tivesse perdido algo? Eu não deveria estar feliz por ele parar de me encarar?
Lena a olha e franze a testa com franqueza.
- Porque você perdeu, sim. Perdeu a chance de ser sutil e deixar as coisas acontecerem.
- Sabe o que eu vou fazer? – Indaga Violeta, trincando os dentes e voltando a olhar para Fernando, que escrevia em um caderno, parecendo muito concentrado. – Eu vou amarrá-lo a mim. Deixá-lo fodidamente apaixonado. Fazê-lo rastejar e depois mastigar o coração dele como faço com essa maçã, só porque ele conseguiu provocar o meu.
Lena balança a cabeça, sem se alterar.
- Nem preciso dizer nada, sei que você não é idiota o suficiente para fazer isso. Amarração de amor, Vi?
- E se eu quiser ser idiota pelo menos uma vez?
- Não vai ser só uma vez. Vai ser uma idiotice que você vai carregar pelo resto da vida.
- O que eu faço, então? Eu simplesmente não consigo parar de pensar qual é o problema dele.
- Se lembre de que ele não é problema seu. – Provoca Lena. – E vá pra outra. Cadê o nosso amigo rockeiro que também te come com os olhos?
Violeta dá de ombros.
- Eu não sei. Não o vi hoje. Será que eu fui amaldiçoada? Será que todos os caras do mundo vão começar a me encarar e nunca falar comigo?
Lena aperta a mão dela sob a mesa.
- Apenas dê tempo ao tempo. E pare de ser uma devoradora de maçãs e corações.
Violeta não respondeu. Apenas continuou a encarar Fernando Bragança à distância enquanto dava mais uma mordida na maçã, sentindo um leve arrepio na espinha.

***

A primeira semana de aula de Lucas chegava ao fim.
Na tarde de sexta-feira, o garoto chegou a Pensão depois da aula e foi direto falar com Ana Rosa, que estava plantando algumas mudas.
- Estou nervoso – comentou ele, encarando os próprios pés.
- Vai dar tudo certo, guri – diz Ana Rosa, secando o suor da testa com a luva de jardinagem.
- A senhora não me contou o que planejou – disse Lucas, tenso. – A senhora nunca me diz nada...
Ana Rosa se ergueu, batendo a terra do avental.
- Não tenho nada pra dizer. Vou fazer como fiz com o Samuel. O ritual das sete encruzilhadas.
Lucas esperou que ela continuasse.
Ana Rosa se aproximou dele, e Lucas a achou muito velha naquele momento.
- Hoje é a primeira noite de lua cheia desse mês, e você vai beber uma poção que eu preparei. Mas para que ela tenha efeito, é preciso que você esteja sob a luz do luar, em uma encruzilhada.
Lucas a olhou, assombrado.
- Encruzilhada? Tipo... Solto por aí? Mas... E o quarto? Não é justamente para isso? Para que... Não haja perigo?
- É o único jeito. O quarto serve para as outras noites. Mas na noite de plenilúnio, você ficará na encruzilhada. Serão sete encruzilhadas, sete rituais, sete luas cheias, sete meses. É necessário para que a poção funcione e para que você não enlouqueça. Se não levar o cão para passear de vez em quando, ele vai matar você.
- Eu prefiro que me mate – cospe Lucas – do que matar outra pessoa.
Ana Rosa o encara, mas pela primeira vez o garoto não desvia o olhar.
- Então vamos tratar de que ninguém precise morrer. Me dê ao menos um pouco da sua confiança. Sou sua última esperança, não sou?
- Por favor – sussurra Lucas em resposta, a voz rouca pelo medo. – Não sei como fazer isso. Não sei como controlar. Quando aconteceu pela primeira vez eu fiquei tão apavorado... E dessa vez vai ser mais forte. E eu estou me perdendo totalmente.
- A sua besta precisa ser exercitada antes de ser exorcizada. – As palavras de Ana Rosa o fizeram se calar, porque soaram mais sombrias do que qualquer coisa que aquela bruxa já tivesse dito. – Ansiedade só vai atrapalhar. Aceite logo essa praga como parte da sua natureza, por hora. Você só tem que seguir as minhas instruções.
Lucas assentiu, desgostoso.
Sentiu um rugido satisfeito dentro de si mesmo.
As trevas estão dentro de mim.

***

- Por Jesus e Buda, Fernando. – Kenji agitou as baquetas no ar. – Se você errar de novo, juro que coloco o padre Eulálio com um cavaquinho no seu lugar.
Fernando dá de ombros, cabisbaixo, embora soubesse que Kenji só estava brincando com ele. Aquele era Kenji, japonês de fábrica, morava na Liberdade e tudo. Mas quando não estava ajudando os pais a servir sushi no restaurante deles, era o melhor baterista que Fernando conhecia, e a melhor pessoa também.
Eles eram amigos desde a infância. A mãe de Kenji era católica, e sempre o arrastava com ela para as missas. O pai era budista e raramente aparecia por lá. E Kenji era uma espécie de viciado em animes folclóricos, que via na Ordem a chance de realizar o seu sonho de ser um ninja caçador de demônios.
- Foi mal. – Murmurou Fernando, irritado consigo mesmo por estar errando tanto em uma música que não era tão complicada. – Não estou muito legal hoje.
- Quem é ela? – Indagou Giulia, a outra guitarrista, estourando uma bola de chiclete.
- O que? – Fernando franziu o cenho.
- Bobão. – Ela sorriu. – Está assim por causa de alguma menina, não é?
Fernando balançou a cabeça, rezando para não ficar vermelho, porque o rosto de Violeta foi a primeira coisa que lhe veio à cabeça.
- Nada haver.
Ele agradeceu mentalmente por nenhum dos seus amigos da banda e da Ordem estudar no mesmo colégio que ele. Ou já teriam percebido. Já saberiam que Violeta o havia olhado nos olhos e o chamado de covarde, com toda a perversidade que uma bruxa poderia colocar em palavras.
- Fernando, se você não transa e não tá a fim de fazer música, fala logo. A minha garganta não é de ferro.
Aquele era Jonathan, o vaidoso e petulante vocalista. De todos ali, era de quem Fernando menos gostava, embora ele cantasse bem.
- Que bela coisa para se falar, quando estamos no porão de uma igreja. – Ironiza Fernando.
- E daí? – Jonathan dá de ombros. – Eu não fiz voto de castidade. Estou aqui pela banda. E pela Ordem.
Fernando balança a cabeça, se sentando em um banco de madeira e fingindo afinar as cordas da guitarra.
Mas a verdade era que ele estava com raiva.
Os olhos castanhos cheios de amargura e desafio de Violeta não lhe davam paz, invadindo todas as suas lembranças.
Você é um belo de um covarde.
- Pessoal, não vamos perder o foco. – Era Giulia, com sua voz mais autoritária. – Se quisermos divulgar a banda e atrair mais público, vamos ter que arrasar. Talvez devêssemos pegar alguma coisa mais legal, tipo Coldplay.
- Você quer tocar Paradise? – Indaga Kenji, com ar divertido.
- Prefiro The Scientist. – Declara Jonathan.
- Eu não sei. – Giulia tomba a cabeça para o lado. – O que você acha, Fernando?
- Tanto faz.
- Eu gosto de Violet Hill. – Diz ela. – Mas acho que não é tão famosa quanto as outras.
Fernando ergue a cabeça no mesmo instante.
- Vamos tocar essa.
- Violet Hill? Você conhece?
- Não. Mas eu quero tocá-la.

***

Como em todas as sextas-feiras, Jaime tinha aulas de judô, e Lena foi ao shopping encontrar Violeta depois do seu turno na academia, para irem juntas pra casa.
Violeta já havia terminado, e já havia pego a bolsa e se despedia do chefe quando Lena chegou.
- Novidades? – Perguntou.
- O mesmo de sempre. Jaime me troca por um quimono toda sexta à noite!– Brinca Lena, em falso tom de aborrecimento. – Estou pensando em pedir um divórcio.
Violeta ri.
- Faz tempo que não saímos juntas. Porque não aproveitamos que estamos aqui e vemos um filme?
- É, podemos fazer isso. O que tem de bom em cartaz?
Violeta ia responder, quando o celular dela tocou.
Era Ana Rosa.
Violeta sorriu e colocou no viva voz.
- Fala, tiazinha.
Lena riu.                  
- Olha o respeito, guria! Onde você e a namoradeira estão? – Indaga Ana Rosa, do outro lado da linha.
- Ainda no shopping – diz Violeta. – Vamos ver um filme.
- Não, senhorita! – Ralha Ana Rosa. – Peguem o ônibus e venham direto pra casa. Direto! Já está bem tarde...
- E daí? – Pergunta Lena, sem entender.
Ela e Violeta se entreolham, confusa.
- E daí?! – Grita Ana Rosa. – Vocês não ficaram sabendo? Tem um atirador na região! E ele está matando mocinhas inocentes por aí...
- Não fiquei sabendo de nada disso. – Diz Lena, desafiadora.
- Nem eu – concorda Violeta.
- Pois estão sabendo agora! – Berra Ana Rosa. – Não se atrevam a me desacatar, senhoritas. Venham pra casa. Tem torta de espinafre no forno.
- Você vai sair? – Indaga Violeta.
- Não é da conta de vocês.
- O atirador não mata bruxas velhas? – Provoca Lena.
Ana Rosa xingou e as ameaçou antes de desligar o telefone, que, pelo som, foi batido com força no gancho.
Lena e Violeta se entreolharam, incrédulas.
- Ela me tira do sério. – Comenta Violeta.
- Às vezes eu acho que ela está tentando nos deixar loucas. – Rebate Lena.
- É melhor irmos mesmo pra casa – suspira Violeta. – Ou ela vai conseguir mesmo nos deixar tão malucas quanto ela.

***

Uma mulher extraordinária espalhava animais mortos pela floresta no meio da noite...
Ana Rosa Arabella jogou o último cadáver de roedor no mato, dando um suspiro de alívio.
Havia feito um mapeamento perfeito da área, planejado tudo... Agora era só cruzar os dedos para que nada desse errado.
Olhou em volta, pensativa.
Ela havia penetrado bastante na floresta, fazendo uma trilha com os pequenos corpos de animais, que começava na encruzilhada e ia até o bosque.
Não havia casas por perto, e o caminho era bastante longe da estrada para que houvesse um risco muito alto de alguém aparecer por ali naquela noite.
A mulher, então, dobrou o saco onde carregara os animais e abriu caminho entre árvores e arbustos até onde sua velha e leal caminhonete estava estacionada, próxima ao cruzamento da avenida que levava para fora da cidade com uma rua onde só haviam terrenos para serem loteados.
Era uma encruzilhada ideal.
Ela olhou para o garoto que a esperava, sentado dentro da caminhonete, cabeça apoiada no vidro e olhar distante. Um olhar que provavelmente observava a cruel Lua Cheia.
Ora... Ele ainda é uma criança, pensou, abrindo a porta da caminhonete.
- Já está na hora, guri – disse, cautelosa. – Já passa das onze.
Lucas encarou aqueles olhos sábios por trás dos óculos quadrados.
- Certo. Melhor... Eu ir.
Ele saltou o carro e se encostou a um poste que lançava uma fraca luz, no meio da encruzilhada.
Devagar, com a mente um pouco distante, Lucas deixou a mochila que trazia em um canto, escondida por um arbusto.
Ana Rosa continuou observando-o, com pena, embora tentasse não demonstrar.
- Você bebeu a poção?
- Sim. Aquilo tem gosto de café velho, sabia?
- Que bom, guri.
- Não vai me contar o que tinha nela?
Ana Rosa deu um meio sorriso.
- De jeito nenhum. Venho te buscar assim que o sol nascer. – Diz, fazendo uma longa pausa. – E... Guri, vai dar tudo certo.
Decidida, ela foi até ele e lhe deu um beijo na testa antes de partir.
Foi a coisa mais maternal que Ana Rosa Arabella fizera por alguém até então, e foi justamente o que Lucas mais precisava naquele momento.
- Obrigado. – Sussurrou ele, vendo a caminhonete partir, deixando-o no silêncio solitário da noite.
Olhou em volta.
Sozinho na encruzilhada.
Com um suspiro, Lucas começou a se despir.
Hoje a noite não seria dele.
Seria do monstro.
Ele até podia sentia a fera se vangloriando dentro do próprio peito.

***
Fernando não conseguia dormir.
Tá legal, ele não deveria ter tomado dois cappuccinos grandes, com o pessoal da banda quando já era tarde, então de certa forma merecia a insônia.
Mas o que ele não merecia de jeito nenhum era ter Violeta e toda a sua presunção gritando na sua cabeça.
Ela está acabando comigo. E eu estou deixando.
Voltou a abrir o caderno onde havia começado a fazer anotações, mas não conseguia prosseguir com os apontes calculistas.
Pulou duas páginas e começou a fazer rabiscos.
Quase sem querer, começou a escrever palavras.
Versos.
Jogar tudo o que o incomodava no papel.
Quem sabe assim ele não compunha uma música nova?

O seu veneno escorre da sua boca em forma de uma maçã, e depois rodopia pra sempre na minha cabeça.

Fernando leu o que acabara de escrever, mortificado.
O que estava acontecendo com ele?
Porque ele estava deixando as coisas chegarem a esse ponto?
Fez menção de rasgar a folha e amassar. Picar. Queimar.
Mas apenas fechou o caderno, irritado, e foi se deitar.
Ele estava ciente de que, se permitisse que Violeta tivesse qualquer poder sobre ele, ela mastigaria o seu coração do mesmo modo tranquilo com que mastigava uma maçã no refeitório da escola.
Porque ele ainda a observava, em cada movimento. Só havia aprendido a ser mais discreto.

***

Violeta rodopiava pelo jardim de rosas da Pensão Arabella.
Percebeu, de repente, que o portão estava aberto.
Curiosa, avançou até ele.
Quem teria deixado aberto?
Lena? Ana Rosa? Sr. Cardoso?
Foi então que ela percebeu que havia alguém parado em frente ao portão, como se esperasse um convite para entrar.
E era Fernando Bragança.
Violeta sorriu.
Ele sorriu de volta, e esticou a mão na direção dela.
Ela olhou e viu que ele lhe oferecia uma maçã.
A garota deu um passo na direção dele para alcança-lo, mas nesse mesmo momento o portão se fechou sozinho, batendo com força.
Fernando deixou a maçã cair e rolar no chão, agarrando as grades e sacudindo-as, enquanto Violeta, confusa, também puxava as barras de aço do portão que os separava, mas o portão não abria.
Foi ele quem viu primeiro, antes que ela pudesse perceber.
O monstro, logo atrás de Violeta, arreganhando os dentes.
Fernando arregalou os olhos verdes.
- Violeta, cuidado!

Violeta se sentou na cama, em um estado entre pânico e pavor.
Lena dormia e o quarto estava em silêncio.
Demorou para que o coração dela parasse de bater com tanto desespero e ela conseguisse voltar a se deitar.
Ela tentou se lembrar do pesadelo, mas parecia que sua cabeça estava fazendo questão de apagá-lo, e os detalhes já estavam sumindo.
Violeta voltou a sentir sono.
Um drama se aproxima... Foi seu último pensamento confuso antes de voltar a dormir. Não sonhou mais nada naquela noite.

CONTINUA

Comentários

  1. Giovanna Rubbo nem pense em deixar a Violeta com o Fernando no final da história hein?! Não ligo para esse drama não. Gosto tanto do Lucas... *-----* Ele é um amor. Não quero saber de ficadas hein? No final ela vai ter que escolher um só, por favor, que seja o Lucas (dedos cruzados).
    E eu amo o jeito que a Ana Rosa diz "guri" toda hora.

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  2. Mas eu gosto do Fernando... :P kkkkk
    Veremos, Carla, veremos u.u

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